por Douglas Franzen
Professor Uceff Itapiranga
O canto coral é outro elemento significativo
para a cultura local. Presente desde os primeiros tempos da colonização é um
valor cultural herdado da imigração alemã do século XIX. As sociedades de corais em colônias alemãs do
Brasil foram implantadas nos mesmos padrões das Gesangvereine e Singvereine,
muito comuns na Áustria e na Alemanha do século XIX. Na visão de Gabriel e
Souza (2017), na Europa essas instituições aglomeraram atividades culturais que
até então eram vinculadas à instituições tradicionalmente constituídas e que
perderam espaço na sociedade naquele período, como as cortes e as igrejas. No
contexto da imigração “imigrantes alemães residentes em diversas regiões brasileiras
procuraram perpetuar a tradição dessas sociedades corais europeias no Brasil
com a fundação de suas próprias associações em território brasileiro” (GABRIEL;
SOUZA, 2017, p. 88).
Em
Itapiranga a prática coralista esteve muito atrelada à Igreja Católica,
estimulada principalmente pelos padres jesuítas. É preciso destacar de que
grande parte da prática do canto coral historicamente esteve atrelada a uma
prática cultural sem fundamentação erudita. Ou seja, grande parte dos regentes
de coral e dos cantores não possuía uma formação acadêmica. As comunidades que
se formaram na colonização de Itapiranga constituíram um padrão social em que a
prática religiosa era muito consistente, e nessa dinâmica se formou a tradição
coralista, principalmente de vertente sacra.
Coral da Associação Cultural Fai, 2018 |
Membros de Corais de Itapiranga na celebração dos 90 anos de Porto Novo. |
Regentes de Corais homenageados pela Aceti. |
A
maioria das comunidades de Itapiranga possuía seu próprio coral, formado por
homens e mulheres. Em alguns casos houve a ocorrência do coral masculino,
formados por vozes de homens que se tornou um elemento muito presente na
cultura local. Nesse sentido, um elemento muito importante para compreender o
canto coral em Itapiranga foram as escolas paroquiais, onde em cada comunidade
se instalava uma escola para a educação das crianças e adolescentes.
Geralmente, como ocorreu na maioria das comunidades, o professor dessa escola
era nomeado pela comunidade e pela colonizadora. O professor era uma
personalidade e uma liderança na comunidade, lidava com questões de educação e
de cultura, estando à frente de atividades culturais e recreativas, como era,
por exemplo, a regência do coral. Nessas escolas paroquiais as crianças tinham
instruções musicais e eram estimuladas no canto coral, o que colaborou na
formação de uma cultura musical muito consistente (EIDT, 1999).
“Ter um coral para
cantar nas missas era uma questão religiosa, mas também fazia bem ao ego dos
habitantes locais, visto que a falta de um coral na comunidade diminuía a
imagem da mesma e da sua gente. Nos anos 70, foram introduzidas as Associações
Corais, as quais filiaram todos os simpatizantes e interessados, formando um
órgão administrativo e mantenedor do coral. Neste esquema, o direito elementar
do sócio aparece in memoriam et in
réquiem, pois terá a presença do coral após a sua morte, na missa do seu
enterro ou na de algum familiar seu” (JUNGBLUT, 2000, p. 354)
A
prática do coral representa um elemento muito significativo para a cultura
local. Está inserida no cotidiano das comunidades, nas práticas simbólicas e
nas celebrações no espaço rural e urbano. Durante grande parte da história de
Itapiranga, principalmente com a ausência da energia elétrica e da televisão, o
canto representou um elo de pertencimento e de identidade, onde as pessoas se
reuniam para cantar e celebrar. Nesse sentido, o canto coral é uma das várias
manifestações musicais herdadas historicamente e ressignificadas pela dinâmica
da cultura.
O canto cria laços afetivos
e sensoriais com a história, mantêm vivo um sentimento de identidade e de
pertencimento, a lembrança de um passado, das gerações antecessoras, da memória
do imigrante e da terra natal Alemanha. Nesse sentido, o canto coral tem um
papel significativo na dinâmica do patrimônio imaterial, porque permeia vários
elementos significantes da identidade e da memória local. A identidade é uma
construção social que se fundamenta na diferença, nos processos de alteridade
ou de diferenciação simbólica. Para Arévalo, “a memória é um elemento
constituinte do sentimento de identidade, na medida em que ela é um fator
extremamente importante do sentimento de continuidade e de coerência de uma
pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si” (ARÉVALO, 2004, p. 934).
No ano de 1964 foi fundada a
Liga Cultural e Artística de Coros da Fronteira, entidade que engloba os corais
de diversos municípios da região Extremo-Oeste de Santa Catarina. Em Itapiranga
a entidade que coordena as atividades dos corais é a Associação Itapiranguense
de Coros (Ascorita), que engloba treze corais do município. O fortalecimento
dessas entidades demonstra o quão significativo é o canto coral para a história
local permeando a concepção de patrimônio imaterial e sua relação de
proximidade com a identidade cultural.
Apresentação Coral São Pedro Canísio.
Coral Municipal de Vozes Masculinas de Itapiranga
Referências de Pesquisa
ARÉVALO. J. M. La tradición,
el Patrimônio y la identidad. In: Revista
de estúdios extremeños, Vol 60, nº 3, p. 925-955, 2004.
GABRIEL, Ana Paula; SOUZA,
Susana Cecília. Martin Braunwieser (1990-1991) e sociedades corais alemãs de
São Paulo: práticas de repertório europeu. In: VIDEIRA, Mário; DE OLIVEIRA,
Ísis Biazioli (Orgs.). Anais da Jornada
Acadêmica Discente do Programa de Pós Graduação em Música ECA/USP. São
Paulo: ECA-USP, 2017, p. 86-97.
JUNGBLUT, Roque. Documentário Histórico de Porto Novo. São Miguel do Oeste: Arco
Íris Gráfica e Editora, 2000.
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